Total de visualizações de página

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Defendi quem eu acreditava, diz secretário do DF que foi escudo de Gaddafi - Notícias - Internacional

Defendi quem eu acreditava, diz secretário do DF que foi escudo de Gaddafi

Bruna Borges
Do UOL, em Brasília
 Ouvir texto
 
0:00
 Imprimir Comunicar erro
ditador líbio Muammar Gaddafi, morto em 2011, tinha um amigo fiel no Brasil. O subsecretário de Movimentos Sociais e Participação Popular do Distrito Federal, Acilino Ribeiro, tem no currículo o histórico de ter pertencido à guarda pessoal de segurança de Gaddafi. Na década de 1970, Ribeiro foi treinado na Líbia e chegou a ser escudo humano do ditador.
O subsecretário inclusive descreve Gaddafi como um "humanista". Ele também conta que integrou um grupo patrocinado pelo ditador, a operação Galaxy, que tentou evitar mortes de guerrilheiros exilados perseguidos pela operação Condor (ação conjunta de ditaduras da América do Sul para assassinar opositores aos regimes ditatoriais).
Na ditadura, Ribeiro foi preso aos 15 anos após reunir colegas para protestar contra a falta de água no colégio. Mas ele não ficou na cadeia muito tempo. Ao saber da prisão, sua mãe invadiu a delegacia armada e vestindo uma camisola, rendeu os policiais e o libertou.
O subsecretário é advogado, professor de geopolítica e ativista de esquerda. É piauiense e a vida toda lutou pelos direitos sociais. Seu trabalho na equipe do governador Rodrigo Rollemberg (PSB) é desenvolver estratégias e articular o diálogo entre Executivo e manifestantes em constante atrito com falido governo do DF, que atrasou salários e enfrentou greves e protestos.
Confira os principais trechos da entrevista:
UOL - Como o senhor virou segurança de Gaddafi?
Acilino Ribeiro: A segurança dele era a tribo dele, que fazia o primeiro ciclo de segurança. O segundo ciclo de segurança eram as Forças Armadas e o serviço secreto. E você tem o terceiro ciclo, que são os guerrilheiros do mundo todo. Eu fazia parte desse terceiro ciclo. Eu cheguei a ficar muito próximo e ser o próprio escudo humano em determinados eventos que ele fazia. Durante o tempo que você ficava na segurança dele, você não podia ter contato com o mundo exterior. Porque, se saísse, você era ameaçado: "Se não matar Gaddafi, nós vamos pegar alguém da sua família".
Houve algum momento mais tenso na segurança dele?
Eu estava em Benghazi [Líbia] e ia acontecer a inauguração das comportas de um rio para a água do [mar] Mediterrâneo entrar no deserto. Duas horas antes, vêm os agentes do serviço secreto dizendo que tinham a informação que poderia ter um atentado contra ele. Aí foi uma [coisa] pavorosa. Nessas horas ninguém quer fazer a segurança dele. Disseram para ele não ir, mas ele disse: "Eu vou e eu sei quem vai comigo"' e olhou para mim. Eu fui porque naquele momento eu estava defendendo um homem em quem acreditava. Ele estava gastando US$ 25 bilhões para levar água a uma população que morria de sede no deserto. [Gaddafi era] um homem com quem eu conversava e ele me falava sobre Maomé e eu falava sobre Jesus Cristo. Ele conversava comigo sobre religião, conhecia mais a Bíblia do que eu. Ele me disse que Maria é citada mais no Corão do que na Bíblia, na Bíblia só seis vezes e no Corão são 11. E que os muçulmanos respeitam Maria tanto quanto nós cristãos. Um homem que dedicou a vida pela luta pela paz, pelos direitos humanos e pelo meio ambiente.
O senhor lembra de Gaddafi como um humanista e o mundo o via como um ditador. Pode comentar isso?
Ronald Reagan e George W. Bush [cometeram] crimes por invadir o Iraque ou mesmo o próprio Barack Obama, que deveria estar na cadeia pelos assassinatos que tem cometido no Oriente Médio. Isso é um absurdo. É esse tipo de coisa que a mídia mundial esconde. Os Estados Unidos vivem uma falsa democracia. Outro exemplo é o que está acontecendo agora na Síria. Os Estados Unidos pagam a mídia para demonizar o Bashar al-Assad, mas a mídia é proibida de falar que é ele quem protege os cristãos que estão lá. O Assad protege os cristãos e combate o Estado Islâmico. A Al-Qaeda foi criada e patrocinada por quem? Pelo imperialismo norte-americano. Mas a mídia não pode dizer isso. Eles demonizaram Gaddafi dizendo que ele financiava o terrorismo. Como que ele financiava o terrorismo se quem praticava isso eram os Estados Unidos? É a manipulação feita pela mídia. A mídia americana estimulou a opinião pública contra Gaddafi porque ele lutava pela paz mundial e pelos direitos humanos e isso não interessava ao imperialismo capitalista. Ele montou a operação Galaxy para se contrapor à operação Condor.
De onde surgiu a operação Galaxy?
Por volta de 1978, acontecia uma operação secreta [na América do Sul]. Nós não sabíamos o motivo de tantos companheiros [guerrilheiros exilados] estarem desaparecendo, era a operação Condor. Prendia brasileiros na Argentina, matava no Chile e enterrava no Uruguai para não deixar vestígios. E o Brasil foi responsável por isso também. Surge então uma outra operação contra a Condor, a operação Galaxy, que foi financiada por Gaddafi. Ele chamou guerrilheiros de todo o mundo. Eles passaram três meses [nos] treinando na Líbia. O objetivo era lutar contra os braços do Condor.
O senhor pode citar uma ação da Galaxy?
Na ditadura, o serviço secreto das ditaduras latino-americanas e a CIA [agência de inteligência norte-americana] infiltraram pessoas no escritório do Acnur [Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados] da Argentina, conseguiram pegar uma lista com nome e endereço de 26 pessoas refugiadas em outros países e entregaram para a operação Condor. Três dias depois todos esses exilados sumiram. Foram presos, mortos, assassinados pelo serviço de inteligência dos países. Inclusive tinha brasileiros mortos. Depois, descobriu-se que havia uma outra lista com 54 pessoas que a Condor estava atrás para pegá-las em Buenos Aires. Foi quando a Galaxy monta uma operação para não permitir que a Condor não consiga pegar a lista. A lista estava em um cofre em um dos escritórios do Acnur. Não podia explodir a sede do Acnur, então tentaram roubar o cofre, mas não se conseguiu e se tentou explodir o cofre lá dentro mesmo. O resultado final da operação é que a gente deu sumiço na lista. E a CIA e o serviço de inteligência desses países não conseguiram pegar a lista. Os 54 que estavam naquela lista sobreviveram.
Quando foi a última vez que o senhor se encontrou com Gaddafi?
Foi em 2009. Eu fui levar a seleção brasileira de futsal para Líbia. Eu disse a ele: "Coronel, posso lhe dar uma sugestão? O senhor está vendo que Fidel Castro deixou o poder, entregou a Raúl Castro. O senhor vai fazer a revolução da revolução. Eu acho que o senhor deveria se afastar de toda e qualquer função política desse país. Só quem tem menos de 40 anos assume o poder. O senhor entrega o poder e vai fazer uma revolução, como efeito dominó vão cair todos os governos do Oriente Médio". Ele me perguntou: "Eu vou entregar o poder para quem?". Eu disse: "O senhor entrega para a Ayesha, sua filha". Uma mulher que na época era embaixadora da ONU [Organização das Nações Unidas] pela paz, uma pacificadora. E ele me disse: "A Líbia são 500 tribos, quando eu deixar de ser o elo entre o elas, nós vamos nos matar". Está aí o resultado, a Líbia continua essa briga entre as tribos. Gaddafi não ocupava cargo de chefe de Estado, lá tinha um primeiro-ministro e ele era um líder espiritual de uma revolução.
Como o senhor descreve a queda de Gaddafi?
A Líbia foi o único país que não teve Primavera Árabe. Ali, o que houve foi uma ocupação militar. Como Gaddafi tinha apoio de 99,9% da população, a Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte] mandou um recado para Gaddafi para que ele entregasse os postos de petróleo para as empresas americanas, francesas e inglesas e assinasse a concessão de sua exploração. Isso ele me disse. Ele já tinha desistido do programa nuclear por esta característica pacifista que ele tinha. E como Gaddafi não assinou, mataram ele. Usaram a Otan, que se acha xerife do mundo para decidir quem é que deve ou não morrer. Mataram 15 mil crianças inocentes. Morreram 150 mil pessoas nessa guerra maluca.
O senhor foi preso adolescente. Como foi isso?
Com 15 anos eu morava em Brasília e passei a fazer parte do movimento estudantil. Faltou água do colégio e o diretor, em vez de chamar o pedreiro para botar as torneiras, chamou a polícia. Eu estava lá na manifestação e a polícia levou todo mundo. Minha mãe soube que eu estava sendo preso e invadiu uma delegacia da ditadura militar e me tirou. Ela entrou na prisão armada, rendeu os policiais e me levou para a rodoviária. Ela me mandou para o Piauí. Estava com um medo danado. Atravessei a região da guerrilha do Araguaia e me recordo que passei numa barreira policial. Como eu era um menino, nem me pediram documento nem nada. Tinha uma senhora do meu lado e eles pensavam que eu era filho dela. Minha mãe ficou respondendo o processo no meu lugar e eu fiquei um ano clandestino no Piauí, sendo protegido pela minha família.
E o que o senhor fez ao retornar ao Brasil após o exílio da ditadura?
[Depois da operação Galaxy] eu volto ao Piauí e vou ser advogado das prostitutas, dos favelados, dos mendigos, dos sem-teto e dos sem-terra. Eu não cobrava de ninguém. Eles me pagavam com rapadura, com farinha. Era assim que eu advogava. Para eu comer, se eles não me dessem comida, eu não comia, porque eu não cobrava. A gente assinava o contrato só para assinar mesmo. Mas não tinham dinheiro para me pagar. Eu me candidato a vereador, mas só para divulgar as ideias e dá uma zebra e eu sou eleito. Depois passo a ser superintendente do Incra [Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária]. Eu estava fazendo a reforma agrária pacífica e acalmando o campo. Em 2006, eu volto para Brasília e reencontro velhos amigos históricos como Carlos Siqueira, que hoje é o presidente do PSB, e Miguel Arraes, velho companheiro de luta. E venho para o PSB.
Você é subsecretário de Movimentos Sociais. Como é dialogar com tantos grevistas em um Estado falido como o DF?
O governador Rodrigo Rollemberg é um homem profundamente preocupado com a coisa pública, que tem a perspectiva de tirar o GDF dessa falência. E quer criar mecanismos de participação social que permitam a população ter uma vida participativa de seu próprio destino. Eu prefiro errar com o povo do que acertar sem ele. A orientação que recebo é de diálogo permanente e a prevenção para evitar conflitos. A população do DF está compreendendo que é um Estado falido, sem perspectiva imediata, mas a médio prazo de recuperação. Como responsável pela articulação com os movimentos sociais nesses cem primeiros dias, nós estamos com uma agenda reativa, porque nós estávamos com uma demanda reprimida do governo anterior, que deixou muito problemas. A cada dia tenho que fazer essas negociações com grevistas, passeatas, obstruções de vias. Todo tipo de manifestação. E como eu compreendo esse tipo de manifestação, porque vim desse movimento.
Ampliar

Relembre a trajetória de Muammar Gaddafi40 fotos

15 / 40
10.mar.1999 - O presidente líbio Muammar Gaddafi concede entrevista no Egito. Naquele ano, o país ''comemorava'' o 30º aniversário de Gaddafi no poder do país Leia mais10.mar.1999 - AFP

Relembre o ditador líbio Muammar Gaddafi


Defendi quem eu acreditava, diz secretário do DF que foi escudo de Gaddafi - Notícias - Internacional

Nenhum comentário :

Postar um comentário