Petroleiros avaliam que plano de (des)investimentos da Petrobras é um desmonte da política dos governos petistas desde 2003

Em 1985, os petroleiros realizaram a mais longa greve da história da categoria. É irônico que, 20 anos depois, a categoria esteja discutindo a possibilidade de novamente entrar em greve, para resistir ao desinvestimento na empresa e ao fim do regime de partilha no pré-sal. Irônico, explica José Maria Ferreira Rangel, da coordenação geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), porque tanto a venda de ativos da empresa quando a mudança do regime — proposta pelo senador José Serra (PSDB/SP), na PEC 131/2015 — contam com apoio de setores do governo do PT e podem acontecer em um governo do PT, apesar de representarem rumo contrário ao que foi feito desde 2003.
Foi nos governos do PT que a Petrobras realizou investimentos para crescer e se tornar o que é hoje: uma empresa que extrai 800 mil barris dias de uma reserva que há cinco anos sequer era explorada; que deu lucro de R$ 5,3 bilhões no primeiro semestre, que poderá produzir 5,2 milhões de barris em 2020, o que tornará o Brasil um dos maiores exportadores mundiais de petróleo. Mas a atual diretoria da Petrobras, diz Zé Maria, parece ter optado por voltar ao caminho proposto por Fernando Henrique em 1995. Em vez de defender os interesses do país e da empresa, planeja reduzir investimentos, vender ativos. “Infelizmente a nova diretoria da Petrobras, obviamente com o aval de seu acionista majoritário, que é o governo, está fazendo uma opção pelo mercado”, lamenta Zé Maria, em entrevista, esta tarde, ao Blog do Zé Dirceu.
Ele se refere ao Fato Relevante enviado hoje pela Petrobras à Comissão de Valores Mobiliários, no qual a empresa anuncia uma redução de 37% nos investimentos entre 2015 e 2019 e a venda (desinvestimento) de US$ 15,1 bilhões de seus ativos (sendo 30% na Exploração e Produção, 30% no Abastecimento e 40% no Gás e Energia). O Plano de Negócios anunciado hoje não define somente o valor dos recursos a serem aplicados pela empresa, mas a sua direção estratégica nos próximos anos. E essa direção, afirma Zé Maria, é contrária aos interesses do povo brasileiro.
Blog do Zé Dirceu — Qual a avaliação da FUP sobre  Plano de Negócios e Gestão 2015-2019, enviado pela Petrobrás à CVM hoje?
José Maria Ferreira Rangel — O que a gente nota claramente, pelo que foi divulgado, é que infelizmente a nova diretoria da Petrobras, com o aval de seu acionista majoritário, que é o governo, está fazendo uma opção pelo mercado. Tudo aquilo que foi construído ao longo do governo Lula, de ter uma empresa integrada, que busca cada vez mais expandir os negócios dentro do país e contribuir com seu desenvolvimento, está sendo deixado de lado.

Por que a Petrobras precisa ser uma empresa integrada?
Porque o lucro de uma área compensa enventuais quedas de lucro em outra, como acontece hoje com o negócio de abastecimento, que está mais lucrativo do que o de exploração e produção. Para avançar nessa integração achamos fundamental, por exemplo, concluir a construção das refinarias Abreu e Lima (PE) e Comperj (RJ), assim como fortalecer todas as subsidiárias, em especial a BR Distribuidora e a Transpetro. Mas a proposta da diretoria é no sentido contrário. A empresa pretende abrir mão, inclusive, de setores que não são tão lucrativos mas são estratégicos para o país — e este é outro motivo para que a empresa seja integrada. O setor de fertilizantes, por exemplo. O Brasil é o quarto maior consumidor de fertilizantes do mundo, mas ainda somos dependentes da importação desse insumo. Por isso, defendemos a conclusão da construção da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (FAFEN-MS) e a incorporação da FAFEN-PR (Araucária Nitrogenados) nas empresas do Sistema. Também defendemos a garantia do fornecimento de gás e a plena disponibilidade das Unidades Termelétricas. O que está acontecendo agora é um retrocesso ao tempo dos governos Fernando Henrique, em que a Petrobras não investia e ficava na defesa, só atrasando bola para o goleiro.

Não foram divulgados detalhes sobre o que a empresa pode vender.
A empresa não divulgou detalhes das áreas que vão se desinvestidas porque isso desvaloriza o que vai ser vendido. Mas o tamanho da meta é um indicativo.

A FUP fez uma série de propostas no sentido contrário do plano anunciado hoje. Elas foram incorporadas ao plano?
Nosso companheiro eleito ao conselho protocolou um documento da FUP, com nossas propostas, na reunião de sexta-feira, mas ele foi ignorado. Parece que quem ganhou a eleição foi o Aécio. A nova diretoria da Petrobras está trilhando o caminho de diminuir a empresa, de reverter algo que levamos os últimos 12 anos de governo para fazer, fazer com que a empresa voltasse a ter o tamanho que sonhamos. Esse desinvestimento nada mais é do que uma resposta ao mercado, em vez de uma opção pelo desenvolvimento do país, geração de emprego e de renda. É extremamente ruim.

O argumento da direção da empresa e do governo é que este é um recuo necessário, diante da crise econômica. Esse argumento não razoável?
O cidadão comum pode achar que é razoável. Achar que o país está vivendo uma situação econômica difícil e nada mais justo seria do que pegar a maior empresa do país e desinvestir. Mas no governo Lula, em 2008, com a crise internacional e a quebra dos bancos, a Petrobras fez exatamente o contrário. Não desinvestiu, continuou crescendo. Se estivéssemos escolhido essa receita neoliberal em 2008, o povo brasileiro teria pagado um custo mais alto pela crise desde aquele momento. E é isso que está acontecendo agora, infelizmente com a benção do governo do PT. O governo, como acionista majoritário, tem mecanismos de injetar recursos na companhia. Só um exemplo do que poderia ser feito, e que propusemos no nosso docuento:  o governo abrisse mão, hoje, da parcela que lhe cabe da Cide, de dez centavos na gasolina e cinco centavos no diesel, seriam R$ 6 bilhões por ano. Isso seria um reforço de caixa para a companhia viabilizar seus investimentos.

Esta semana começa o Congresso da FUP. Qual será a pauta?
Começa na quinta-feira e vai até domingo. A pauta é que a defesa da Petrobras é a defesa do Brasil. Vamos ter diversas mesas discutindo toda essa questão e esperamos sair de lá com deliberações e encaminhamentos no sentido de resistir, mais uma vez, a essa ofensiva da direta. Este ano faz 20 anos da nossa greve de 95, que fez o contraponto à política entreguista do governo FHC. E se nosso destino for, aos 20 anos, ter que realizar uma nova greve, contra essa nova investida, daqui a 20 anos vamos lembrar dessa greve de 2015.

Amanhã haverá uma audiência pública sobre o PL 131/2015, que muda o regime de partilha no pré-sal. Qual é a posição da FUP a respeito do projeto?
Não faz sentido discutir isso agora, ainda mais com esta pressa. O projeto é do início do ano e o Senado previu somente uma audiência pública para debater o tema! A Lei da Partilha foi aprovada em 2012, depois de 15 meses de debates, e nem completou um ciclo inteiro. O Campo de Libra, leiloado neste regime em 2013, sequer começou a produzir, só começa em 2020. Os interessados neste projeto, que favorece as petroleiras internacionais, estão se aproveitando da conjuntura para tentar mudar algo estrutural. E trazem argumentos falaciosos. Dizem, por exemplo, que custa caro para a Petrobras participar com 30% de todos os consórcios que exploram o pré-sal. Mas isso é uma decisão do governo, ele pode estabelecer bônus de assinatura menores para a Petrobras. E o ritmo dos leilões também é decidido pelo governo, por meio do Conselho Nacional de Política Energética. Além disso, não precisamos leiloar campos do pré-sal imediatamente, temos uma boa oferta hoje, com os blocos do pré-sal e de concessão, e o preço do petróleo está em baixa. Qual é a pressa? Seria mais honesto, da parte de Serra e dos defensores deste projeto, admitir que não estão satisfeitos com o sucesso da Petrobras. A FUP está tentando fazer parte da mesa da audiência amanhã. Somos contrários ao projeto e vamos defender a Petrobras. Queremos que o tema seja discutido mais amplamente. Não faz sentido tocar isso a toda velocidade. E, veja, é uma ofensiva ampla de retrocessos, acompanhada não apenas do novo plano estratégico da empresa mas de iniciativas como a redução da maioridade penal, tabém votada a toque de caixa. A audiência sobre o pré-sal, amanhã, é quase na mesma hora da votação redução da maioridade penal.
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