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domingo, 19 de julho de 2015

TRAÍDO PELA AMBIÇÃO


Eduardo Cunha é um covarde. Sabe muito bem que o governo não conta com poder de influir no MP a ponto de dar  condução às investigações da Lava Jato. Pelo contrário, tem sido seu alvo preferencial. Os demais não passam de coadjuvantes nesse teatro do absurdo de enredo kafkiano. Sem falar que no meio da patuleia estão alguns de antemão já devidamente blindados.
O super-homem da câmara baixa, assim como todos os candidatos dos partidos aliados, elegeu se no esteio do sucesso petista no governo. Com frequência alegando a aliança com o partido de Lula. O rompimento do PSB, em função da candidatura do outro Eduardo, o Campos, somado ao recuo eleitoral do Partido dos Trabalhadores, possibilitou ao PMDB o exercício de cerrada hegemonia sobre a coligação que manteve Dilma no Palácio do Planalto. Golpeando o PT, Cunha arrancou-lhe a presidência da Câmara. Ao lado de Renan, reconduzido à direção do Senado, passou a encerrar nas mãos poderes maiores do que seria conveniente deter.
De modo que essa concentração de poder não incomodou somente ao governo. Com suas posturas, passaram a por em risco o PSDB em seu próprio campo, disputando com ele o espaço da oposição. E nessa peleja levava a vantagem de ocuparem posições estrategicamente privilegiadas na estrutura do poder e do partido majoritário no governo. Bem entrincheirados, achacam e chantageiam  o governo a vontade,  ao mesmo tempo em  conseguem neutralizar a oposição original, a  dos tucanos.
Mas de onde provêm de fato os golpes que deixaram Cunha atordoado e na iminência de levar um tombo lá de cima do mais alto dos coqueiros? 
Só sendo um imbecil do tipo que presumo falar Umberto Eco, não é capaz de perceber a estreitíssima relação, quase íntima, pra não dizer promíscua, do Ministério Público com o PSDB.   Chega a ser obsceno. Poderíamos enumerar uns cem números de situações em que a mancebia verificou-se patente e notória.  Sob o governo de FHC, reinou Geraldo Brindeiro, primeiro e único, em 4 mandatos na Procuradoria Geral da República. Em seu reinado, o  Procurador Geral  converteu-se em “Engavetador Geral”.  Foi investido por três vezes ao arbítrio de FHC, exercido por direito pelo presidente da república até 2001, quando passou a vigorar a regra da lista tríplice. De acordo com ela, o procurador seria o escolhido pelo chefe do executivo,  entre os três mais votados em eleição realizada entre os pares do ministério público . Não obtendo  votos suficientes para sequer integrar a lista, mesmo assim,  FHC “engavetou” a norma e reconduziu Brindeiro ao cargo por uma quarta vez. Mais de 4.000 processos tomaram o destino das suas gavetas. Não foi a toa que parte considerável da população não tenha tido a menor percepção do quão era escandalosamente corrupto o governo tucano.  
Convém lembrar que desde o governo Lula, e nisso foi seguido por Dilma, que o procurador escolhido pela presidência é aquele que encabeça a lista tríplice. Cai por terra assim, a teoria da conspiração que denuncia suposto aparelhamento do estado pelo Partido dos Trabalhadores.  
Apesar do comportamento republicano dos petistas, os sucessivos procuradores indicados por eles,  ao contrário de Brindeiro com FHC,  dedicaram lhes tratamento que podemos considerar na melhor das hipóteses, como no mínimo,  rigidamente criterioso. De fato, assim deve ser. Mas não raro, chegaram às raias do exagero, havendo caso em que se verificou  abertamente hostil, como foi  Roberto Gurgel. De nenhum deles contou com cumplicidade ou leniência.
Não é apenas na figura do procurador que se pode perceber a identidade do MPF com os tucanos.  Ao que tudo indica, a criatura deixou ovos em profusão plantados naquele corpo.  De tal maneira que dificilmente a instituição enfrenta até as últimas consequências, qualquer habitante do ninho tucano.  Isso quando não continua a “engavetar”,  protelar ou fingir se de João Sem Braço diante de casos que os envolva. Recentemente assistimos à apreensão de um helicóptero pertencente a uma família de políticos aliados de Aécio Neves carregando meia tonelada de cocaína. No dia seguinte ao evento representantes do MP de pronto trataram de afastar qualquer hipótese de envolvimento do Senador e de seu filho deputado no crime. Rapidamente a aeronave voltou para o domínio dos proprietários e nenhum envolvido encontra-se preso para responder pelo grave delito, nos termos da nossa lei de drogas, que vitima milhares de jovens e coloca tantos outros nas penitenciarias.
Diante de tantas demonstrações da extrema consideração que essa instituição devota a um partido político, não tem como então, Eduardo Cunha querer que tenha sido o governo federal e o PT, os responsáveis por empurrá-lo para dentro do redemoinho da lava jato. Mas, entre enfrentar o MP e o PSDB por trás dele, ou espancar um governo fustigado pelos mesmos que o fustigam agora, respaldados por uma mídia em guerra permanente contra o PT, preferiu jogar pedra na Geni.
Com sua reação ameaçadora, responsabilizando o governo pela  desventura que se abate sobre ele, rato que é, quer evitar o confronto direto com o MP e os tucanos.  Em comum com eles, a mesma sanha golpista. Mas se desentendem no que toca à partilha do saque. Espera  talvez que, declarando-se na oposição logrará um recuo na ofensiva que desfecham contra sua pessoa. Facções criminosas, entretanto,  não costumam ser solidárias em vista dos seus interesses na apropriação do butim que visam amealhar.  
Cunha sai do governo desprovido das vantagens que o jogo do claro escuro proporcionado por sua oposição na situação lhe garantia.  O PMDB, através de Michel Temer, manifestou se em favor da  permanência na base, o que reduz sensivelmente seu poder de fogo. Um alívio para o vice-presidente da república constantemente exprimido que era pela truculência do correligionário. De modo que não representa nenhum “reforço” para a oposição. Nela, terá de debelar sua megalomania e contentar-se com uma posição subalterna no novo contexto.
Para ele será como ter nadado, nadado e morrido na praia. Sentir nos dedos o calor do poder e vê-lo escapar como a dissipação de uma miragem é amargar cem anos de frustração.
Nadando já estava o PSDB. A fina flor da burguesia entreguista do estado mínimo minimorum, não está disposta a ceder espaço para o Quasimodo fisiológico parasitário do estado. Definitivamente esse aliado só merece o seu escarro.
Cunha é ousado, atrevido e obstinado. Mas deixando se cegar pela ambição, acabou faltando-lhe a visão do todo. Ou ainda, quem sabe tenha cabulado à aula de física em que foram expostas as leis de Newton, ficando sem saber  que  dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço.
É lícito supor que o ungido foi subtraído da graça do Senhor, sendo iminente a expulsão do paraíso. Resta ao anjo caído reinar em seu inferno particular, prenunciando o surgimento de uma nova igreja ostentação no mercado da fé.


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