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segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Renato Janine: “O PT tem que ir além do PT” | Brasil | EL PAÍS Brasil

RENATO JANINE RIBEIRO | FILÓSOFO E EX-MINISTRO DA EDUCAÇÃO
Renato Janine: “O PT tem que ir além do PT”
País deve aprender a aliar questões social e econômica, diz ex-ministro da educação
O filósofo foi substituído após apenas cinco meses à frente do Ministério
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TALITA BEDINELLI
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São Paulo 11 JAN 2016 - 12:20 BRST
Quando Dilma Rousseff (PT) anunciou em 2015 que seu novo ministro da Educação seria o filósofo e professor da USP Renato Janine Ribeiro seus eleitores comemoraram. A presidenta dava sinais de que tentava, em meio a tormenta política que enfrentava desde o início do segundo mandato, dar um ar de normalidade ao Governo da “Pátria Educadora”, lema que adotara. Mas, passados pouco mais de cinco meses, ele acabou substituído em uma jogada política, para dar lugar a Aloizio Mercadante, ex-ministro da Educação e que na época ocupava a Casa Civil. Janine saiu do Governo sem ter conseguido implementar quase nada de suas ideias e depois de enfrentar uma longa greve de professores federais. Em sua passagem-relâmpago, também viu o Orçamento do Ministério da Educação (MEC) sofrer cortes importantes, como consequência dos ajustes feitos pelo ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
by CloudScoutX


Renato Janine Ribeiro, após tomar posse no ministério, em abril deste ano. ANDRE DUSEK ESTADÃO CONTEÚDO
Visto como um dos principais porta-vozes anti-impeachment na classe intelectual, ele recebeu o EL PAÍS em sua casa, em São Paulo, no fim do ano passado, alertando que não gostaria de falar apenas sobre esse assunto. “Quero deixar claro o seguinte: eu tenho a minha opinião sobre o impeachment, sou contra. Agora eu não vou fazer propaganda todo dia. Não vou falar só disso. Acho, inclusive, que essa não é a questão mais relevante hoje”, afirmou ao ser questionado sobre o tema.

Pergunta. E qual é a questão mais relevante hoje, em sua opinião?

Resposta. O que o Brasil vai fazer em relação a três aspectos básicos. O primeiro deles é como recuperar o crescimento econômico. O segundo é como recuperar e completar a inclusão social. A principal contribuição do PT no Governo, sobretudo nos dois mandatos de Lula, mas muito também no primeiro mandato de Dilma, foi tirar o Brasil do mapa da fome e a etapa seguinte é vencer a pobreza. E o terceiro aspecto é que você tem que fazer tudo isso de uma maneira sustentável. A gente não pode nunca mais ter [o deslizamento de barragem de Mariana, não pode ter nunca mais o incêndio na Estação da Luz, não pode ter um sem número de produtos do descaso que marcam a sociedade brasileira. Descaso na agricultura, na indústria, no serviço, na gestão pública… Esses três pontos o Brasil tem que enfrentar.

Se você olhar, curiosamente, o primeiro deles, que é retomar a economia, é o tema do PSDB e do PMDB. O segundo, que é a inclusão social, é o tema do PT. E o terceiro seria o tema da Rede [Sustentabilidade], no dia em que ela conseguir ter um discurso, o que ainda não tem. Os três pontos têm que ser tratados em conjunto e o problema é que ninguém consegue juntar nem dois deles, nenhum desses atores políticos. Então, qualquer que seja o resultado do impeachment, esses três problemas continuam aí. Eles não são resolvidos nem pela aprovação, nem pela derrota do impeachment.

P. Mas como desvincular essas questões do impeachment se não se consegue avançar para esses pontos enquanto pairar o fantasma do impeachment? Tivemos um ano praticamente perdido…

R. Mas não foi só por causa do impeachment. O impeachment só conseguiu mais peso dos últimos meses. A crise do Brasil no primeiro semestre é uma crise econômica. A crise econômica foi o que viabilizou a crise política. Nós tivemos 12 anos de desenvolvimento econômico em que se produziu uma ampla satisfação dos atores sociais. Começou a dar problema logo depois da eleição, quando se viu que não havia mais dinheiro para continuar isso. Foi uma crise econômica para a qual não houve a capacidade de enfrentamento político.

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P. O professor André Singer afirma que houve uma quebra de pacto entre os atores que ajudavam a manter a economia estável. Que a "burguesia" saiu do cenário…

R. Sim, saiu em função da crise. O Lula conseguiu um sistema de ampla coalizão de classes. Isso no Brasil funciona. Agora, no momento em que não havia mais dinheiro para todo mundo isso entrou em crise. O impeachment é um sintoma. A questão inicial é que chegamos ao fim de um modelo em que o crescimento econômico permitia uma inclusão social maior. E, ao chegar ao fim, ainda surge uma agenda suplementar que é agenda de Mariana. A agenda Mariana simboliza toda essa forma pela qual as coisas foram feitas com descaso neste país desde o descobrimento, isso é uma coisa de 500 anos.

P. A questão ambiental não parece ser prioridade para o Governo Dilma. Se esperava mais do PT?

R. Claro que se esperava mais do PT. Agora, também não dá para ficar brincando de PSOL, com esse voluntarismo de achar que você poderia muito mais do que isso só pela força de vontade. Se o Lula não tivesse feito o pacto com o capital, com a Carta aos Brasileiros, ele não teria chegado ao Governo ou chegando ao Governo não teria governado. Todos os avanços do Governo Lula foram em função de uma política de conciliação de classes. Que essa política teve falhas, teve. Eu posso dizer duas. A primeira foi a de não fidelizar o eleitorado em função dos próprios projetos políticos. Faltou essa política do PT de mostrar que políticas públicas fazem a diferença. Dando um exemplo: quando a Dilma entregou as casas de Pinheirinho, que é uma coisa simbólica porque aquilo representa uma política antissocial do Governo tucano de São Paulo, ela disse: vocês não devem isso a ninguém, a não ser a vocês mesmos. Isso é falso. Sem uma política pública do Governo federal que favorecesse isso, essas pessoas estariam em favelas. Então, para fazer uma frase bonita, politicamente correta, ela despolitizou as pessoas, fez com que elas pensassem que era obra delas. Tanto que uma parte substancial dos beneficiados com as políticas petistas agradece a Deus ou ao esforço próprio, mas não a uma política terrena, deste mundo, laica, que fez mudanças. Eu acho que esse é um erro do Governo petista. Outra falha, que não sei se é um erro, mas é uma insuficiência, é que houve avanço em muitas áreas e não necessariamente a consolidação desses avanços. Existem várias políticas públicas hoje e você vê que nem todas dialogam entre si, nem todas têm recursos suficientes.

P. Você fala isso pela experiência no Ministério da Educação?

R. Na área da educação a crise foi brutal. Na área da saúde também. O então ministro da Saúde, Arthur Chioro, afirmava antes de deixar o Governo que o Orçamento do ano que vem daria somente até setembro. No caso da educação, você tem falta de dinheiro e você tem uma falta de articulação das universidades entre si. Universidades e institutos federais, que somam mais de 100 instituições, trabalham muito pouco em conjunto e a disposição deles em trabalhar em conjunto não é grande.

P. Por quê?

R. Porque o Governo Lula determinou que ele nomearia sempre o mais votado candidato a reitor [de uma lista tríplice escolhida em votação pela comunidade acadêmica e é apresentada ao presidente da República para a seleção final]. Isso acabou criando um ambiente de política dentro das universidades e institutos muito grande. Eu dei posse a um reitor de um instituto federal, cujas metas eram valorizar o servidor e promover a inclusão social. Mas a meta de um instituto é fazer com que a região em que ele está instalado se desenvolva economicamente. E a valorização do servidor nunca pode ser o fim si. Os servidores foram muito valorizados nestes governos Lula e Dilma, inclusive com aumentos superiores à inflação, um grande número de cargos novos por causa da criação de novas universidades e institutos.

P. Você falou sobre a falta de articulação entre políticas públicas. Há uma crítica comum de falta de diálogo entre ministérios. Sentiu isso quando estava no MEC?

R. Eu não senti isso. No caso do MEC nós tínhamos um diálogo muito forte com o Ministério do Desenvolvimento Social, com o Ministério da Saúde e mais uns 15 ministérios. As políticas de inclusão social têm uma parceria muito forte entre o Ministério do Desenvolvimento Social e o MEC. Toda parte estruturante do programa Mais Médicos tem uma colaboração intrínseca do MEC com o Ministério da Saúde.

P. Na época em que você foi ministro, falou-se que havia uma ingerência do atual ministro da Educação, na época na Casa Civil, Aloizio Mercadante. Isso é verdade?

R. Não. Ele era chefe da Casa Civil, função daquele que em nome do presidente da República organiza o Governo. Neste sentido, havia alguma atuação dele, eu dialogava com ele, mas eu não tenho queixas de ingerência, nem político-partidária, nada. O problema lá era a falta de dinheiro, que foi em um crescendo por um lado, enquanto por outro lado havia uma falta de percepção de uma parte significativa da sociedade sobre o tamanho da crise. Por exemplo: as greves das universidades eram greves que pediam coisas absurdas e as pessoas aparentemente não tinham noção do tamanho da crise econômica, ou faziam que eu não tinham.

P. A sua nomeação foi bastante comemorada na época, mas você saiu em cinco meses. Da forma como o nosso Governo é estruturado, há espaço para intelectuais não políticos, pessoas que não sejam ligadas a partidos, assumirem pastas importantes?

R. Nós chegamos em um período de uma crise muito grande. Diante desta crise muito grande o Governo está navegando a curto prazo, não está conseguindo entrar em uma rota de navegação mais forte. Todos os atores estão tomando medidas do dia a dia. É muito difícil você planejar o futuro desse jeito. A reforma que tirou o Chioro, não a minha saída que ela não tem relação com o PMDB e sim com uma pressão do presidente Lula de tirar o Mercadante da Casa Civil... Mas a do Chioro, que teve relação com a aliança com o PMDB, quantos votos rendeu na Câmara? Talvez 20. É muito pouco o resultado. Mas, naquele momento, para a presidenta, pareceu decisivo. A navegação toda está muito no imediato. Em questão de meses nós vamos ter algumas questões resolvidas. O [Eduardo] Cunha provavelmente terá saído, mais políticos e empresários terão sido enquadrados pela Lava Jato. Se for derrotado o impeachment, a presidenta Dilma poderá governar com pouco mais de tranquilidade porque aqueles que querem a saída dela terão que apostar no Brasil. Hoje o que temos é gente que, para fazer o impeachment, quer que as coisas piorem.

P. Em um ano, o país teve três ministros da Educação.

R. É, de fato é uma situação preocupante.

P. Não deveria haver um limite? Educação e saúde ficarem de fora da barganha política?

R. Essa é uma crítica que muitos fazem ao Governo. De que ele não soube dar à educação e à saúde a segurança que essas pastas deveriam ter. Nos dois casos a falta de dinheiro foi grande, mas haviam ideias tanto minhas quanto do Chioro que não tivemos condições de implantar.

P. Como foi a sua saída? Foi frustrante?

R. Não. A saída não foi. A presidenta foi super educada e dava para perceber que havia uma crise muito grande no país e que estava muito difícil manter a educação do jeito que estava. O que foi frustrante foi estar em um período de crise diante do qual não havia uma posição coesa de Governo de como lidar com a crise na educação. Isso foi frustrante. A questão da greve [das universidades federais], foi uma questão muito injusta e eu penso que houve um erro da minha equipe em não tomar medidas mais imediatas. Quando começou a greve a minha equipe, que já estava lá, considerou que uma negociação iria resolver, mas não resolveu. Deveríamos ter ido à público, na televisão, e dito: ‘o dinheiro de que dispõe o Governo é esse, as reivindicações são impossíveis, e não vamos atender’. Ao invés disso, o Governo ficou muito calado, talvez porque estava acostumado a lidar com greves quando havia dinheiro. Para você ter ideia, uma das reivindicações dos funcionários era de passar a trabalhar 30 horas por semana ao invés de 40 horas, mas com o mesmo salário. Isso é uma coisa que exigiria contratação de novos profissionais e nada justifica isso em um momento de crise econômica. Deveríamos ter enfrentado desde o começo, publicando as propostas deles, as nossas respostas, e fazendo a batalha da opinião pública.

P. Será que não era um desgaste político que o Governo não queria enfrentar?

R. Esse é o problema. Talvez o resumo de tudo que eu tenho que dizer pra você é que o PT tem que ir além do PT. O PT fez coisas muito boas para o país, fez um trabalho extraordinário de inclusão social, mas estamos em uma hora em que muito do que foi feito de inclusão social tem que ser revisto para que valha o que tem êxito. O PT ficou, de certa forma, prisioneiro de uma base, em parte sindicalista, que diante das crises recebia mais dinheiro. Se aumentava salários. Mas não se tem condições de aumentar salários de ninguém hoje. O PT deveria enfrentar claramente essa questão e dizer: ‘não podemos aumentar salários e, então, funcionários públicos, vocês que sempre foram uma base grande do PT e que tiveram anos e anos de valorização salarial, vocês vão ter que fazer sacrifícios. Nós temos a meta de melhorar o Brasil agora e retomar o crescimento’. Para isso, o PT tem que deixar de lado uma posição que ele sempre teve, que foi a de transferir dinheiro para essa base. Ele tem que ver que não há esse dinheiro para transferir, tem que dizer isso com clareza e se as pessoas não entenderem ou não quiserem entender, é outro problema. A questão agora é gastar melhor o dinheiro que tem. Há uma série de medidas que poderiam ser feitas, mas que trariam problemas com os grupos políticos que apoiam o Governo.

P. E também com os grupos econômicos. Na educação, por exemplo, existem várias faculdades privadas que ficaram descontentes com as reformulações no Fies [programa de financiamento estudantil para a rede privada].

R. Eu tive um contato até bom com o setor privado de ensino. E me parece que o que eles queriam, sobretudo, era segurança. Eles tiveram uma experiência de no passado uma parte do dinheiro a eles devido não ser pago. A crise ali não foi tão grande. O que houve foi uma decepção muito grande de pessoas que estavam acostumadas a ter sem muito critério. Exemplo: quando foi fixado o mínimo de 450 pontos no Enem para se poder ter o Fies houve uma reclamação muito grande de alunos que não tinham essa nota. Diziam que isso estaria excluindo pessoas. Acontece que para se entrar na universidade tem que se ter alguma qualificação. Uma das regras estabelecidas nesse ano é que quem foi reprovado na redação do Enem não pode ter Fies. É claro que não pode. Como uma pessoa que não sabe escrever na própria língua vai ter Fies? De alguma forma, muitas pessoas ficaram acostumadas com a ideia de que o Estado pode dar indefinidamente sem cobrar nada em troca.

Isso é um problema sério e engata em outro problema muito sério, ético, que é o seguinte: muitos estudantes, muitos alunos no setor público, privatizam o seu diploma. Fazem um curso na USP ou em uma universidade federal boa, se formam e nem passa pela cabeça deles que foram sustentados pelo [imposto do] pobre que compra caixinha de fósforo. Pensam: ganhei esse diploma e vou procurar ganhar o máximo de dinheiro possível com ele, sem dever nada a ninguém, e sem retribuir nada.

P. O Governo tentou, quando lançou o Mais Médicos, instituir um tempo de serviço obrigatório após a universidade para que os médicos atuassem nas áreas periféricas, mas teve que recuar.

R. Sim, o Reino Unido faz isso. A inspiração do Mais Médicos é o Reino Unido. Lá você recebe um financiamento e fica anos trabalhando na rede pública. Não é uma coisa de ‘perigosos comunistas’, é uma coisa de um país intensamente capitalista, governado pelos conservadores na maior parte das últimas décadas, e que faz isso. Agora, tentou-se [no Brasil] por lei. Nos Estados Unidos, independentemente de lei, você tem uma tendência maior a fazer isso. Essa privatização do diploma pelo aluno é uma coisa muito grave. A falta de uma responsabilidade social. Essa coisa de escolher, por exemplo, uma especialidade [médica] que é totalmente mercadológica. Uma ideia de que se você se formou na USP isso te dá um acréscimo de dinheiro, mas não te dá um acréscimo de dever. Precisamos rever muito a educação. Isso é uma mudança de concepção que tem que existir no Brasil.

P. Queria voltar um pouco à sua critica aos movimentos sindicais. O governo petista depende desta base, dos movimentos sociais de esquerda, para se segurar no poder. São eles que vão para as ruas defender a presidenta do impeachment. Como o partido deixará de ser "prisioneiro" desse movimento, se existe um congresso desfavorável e uma direita que quer derrubá-lo?

R. Veja, eu sou a favor dos movimentos sociais, mas eu acho que eles têm que ser corrigidos. O PT está disposto a fazer a inclusão social, mas essa inclusão precisa de dinheiro. Para se ter o dinheiro, é preciso fazer o desenvolvimento econômico e isso o PT não está sabendo fazer. O problema é que está muito difícil para todos os atores políticos perceberem o que falta para eles. Cada um pensa só na sua questão. Se você olha os projetos tucanos e peemedebistas, você vê que eles só pensam na atividade econômica e chegam ao ponto de querer tirar a verba para educação e a saúde, o que é um delírio. Porém, do outro lado, se fala em tirar verba do pró-safra, da [ministra da Agricultura] Kátia Abreu, para colocar na educação. E as pessoas não vão comer? Comer vem antes da educação, gostemos ou não. Está muito difícil para os atores conseguirem enxergar o que vai além do imediato. Não adianta [os movimentos sociais] defenderem uma política econômica não sustentável porque o resultado [no futuro] vai ser ter cada vez menos dinheiro para os programas sociais. Você reduzir ou suspender por um ano o Ciência Sem Fronteiras é uma pena, mas não é grave. Mas cortar o Bolsa Família é colocar pessoas de volta na miséria. A definição de miséria é você ganhar menos do que o necessário para manter a suas condições de vida, é você estar morrendo mais depressa do que deveria morrer. É uma situação que não pode existir. Por outro lado, todas as propostas de reerguimento econômico que eu vi, inclusive as do Levy, causaram danos sociais muito grandes para não reerguerem nada. A economia está pior hoje do que estava quando Levy assumiu. Mas se você tivesse um governo mais à direita no poder haveria provavelmente um arrocho maior e se protegeria menos os projetos sociais. Não vi ninguém do PSDB vindo a público dizer que o Brasil tem que completar a inclusão social, que não podemos ter pobres. Eles já entram direto na discussão da economia, como se fosse um fim em si.

P. O próprio FHC tem feito essa crítica, de que o PSDB tem que defender mais o lado social...

R. Sim, isso é fraco na oposição. Percebe como a situação é um tanto maluca? Você tem o PT, cuja base ignora muito a necessidade de um desenvolvimento econômico. Você tem um PSDB, que não dá tanta importância à inclusão social. E você tem um movimento que seria verde [Rede], que não fez da sustentabilidade uma bandeira nas ruas. Os três pontos que você tem que unir no Brasil estão divididos entre três grupos políticos, mas nenhum deles se abre para o outro lado. Em poucos meses nós vamos ter que enfrentar opções muito importantes e é crucial que a sociedade discuta o que vai ser depois. Tem gente que acha que se tirar a Dilma tudo estará resolvido. E tem gente que acha que se ela se mantiver, que é o que eu quero, tudo estará resolvido. Não estará nada resolvido. Nada.
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Provocador e portador de instigantes reflexões, Bauman espreme a consciência humana até que grite à alma. Alguma reserva com relação à sua apreciação das redes sociais.

Zygmunt Bauman acaba de completar 90 anos de idade e de tomar dois voos para ir da Inglaterra ao debate do qual participa em Burgos (Espanha). Está cansado, e admite logo ao começar a entrevista, mas se expressa com tanta calma quanto clareza. Sempre se estende, em cada explicação, porque detesta dar respostas simples a questões complexas. Desde que colocou, em 1999, sua ideia da “modernidade líquida” – uma etapa na qual tudo que era sólido se liquidificou, e em que “nossos acordos são temporários, passageiros, válidos apenas até novo aviso” –, Bauman se tornou uma figura de referência da sociologia. Suas denúncias sobre a crescente desigualdade, sua análise dodescrédito da política e sua visão nada idealista do que trouxe a revolução digital o transformaram também em um farol para o movimento global dos indignados, apesar de que não hesita em pontuar suas debilidades.
O polonês (Poznan, 1925) era criança quando sua família, judia, fugiu para a União Soviética para escapar do nazismo, e, em 1968, teve que abandonar seu próprio país, desempossado de seu posto de professor e expulso do Partido Comunista em um expurgo marcado pelo antissemitismo após a guerra árabe-israelense. Renunciou à sua nacionalidade, emigrou a Tel Aviv e se instalou, depois, na Universidade de Leeds (Inglaterra), onde desenvolveu a maior parte de sua carreira. Sua obra, que arranca nos anos 1960, foi reconhecida com prêmios como o Príncipe das Astúrias de Comunicação e Humanidades de 2010, que recebeu junto com Alain Touraine.
Bauman é considerado um pessimista. Seu diagnóstico da realidade em seus últimos livros é sumamente crítico. Em A riqueza de poucos beneficia todos nós?, explica o alto preço que se paga hoje em dia pelo neoliberalismo triunfal dos anos 80 e a “trintena opulenta” que veio em seguida. Sua conclusão: a promessa de que a riqueza acumulada pelos que estão no topo chegaria aos que se encontram mais abaixo é uma grande mentira. Em Cegueira moral, escrito junto com Leonidas Donskis, Bauman alerta sobre a perda do sentido de comunidade em um mundo individualista. Em seu novo ensaio, Estado de crise, um diálogo com o sociólogo italiano Carlo Bordoni, volta a se destacar. O livro da editora Zahar, que já está disponível para pré-venda no Brasil, trata de um momento histórico de grande incerteza.
Bauman volta a seu hotel junto com o filósofo espanhol Javier Gomá, com quem debateu no Fórum da Cultura, evento que terá sua segunda edição realizada em novembro e que traz a Burgos os grandes pensadores mundiais. Bauman é um deles.
Pergunta. Você vê a desigualdade como uma “metástase”. A democracia está em perigo?
Resposta. O que está acontecendo agora, o que podemos chamar de crise da democracia, é o colapso da confiança. A crença de que os líderes não só são corruptos ou estúpidos, mas também incapazes. Para atuar, é necessário poder: ser capaz de fazer coisas; e política: a habilidade de decidir quais são as coisas que têm ser feitas. A questão é que esse casamento entre poder e política nas mãos do Estado-nação acabou. O poder se globalizou, mas as políticas são tão locais quanto antes. A política tem as mãos cortadas. As pessoas já não acreditam no sistema democrático porque ele não cumpre suas promessas. É o que está evidenciando, por exemplo, a crise de migração. O fenômeno é global, mas atuamos em termos paroquianos. As instituições democráticas não foram estruturadas para conduzir situações de interdependência. A crise contemporânea da democracia é uma crise das instituições democráticas.
"Foi uma catástrofe arrastar a classe media ao precariat. O conflito já não é entre classes, mas de cada um com a sociedade”
P. Para que lado tende o pêndulo que oscila entre liberdade e segurança?
R. São dois valores extremamente difíceis de conciliar. Para ter mais segurança é preciso renunciar a certa liberdade, se você quer mais liberdade tem que renunciar à segurança. Esse dilema vai continuar para sempre. Há 40 anos, achamos que a liberdade tinha triunfado e que estávamos em meio a uma orgia consumista. Tudo parecia possível mediante a concessão de crédito: se você quer uma casa, um carro... pode pagar depois. Foi um despertar muito amargo o de 2008, quando o crédito fácil acabou. A catástrofe que veio, o colapso social, foi para a classe média, que foi arrastada rapidamente ao que chamamos de precariat (termo que substitui, ao mesmo tempo, proletariado e classe média). Essa é a categoria dos que vivem em uma precariedade contínua: não saber se suas empresas vão se fundir ou comprar outras, ou se vão ficar desempregados, não saber se o que custou tanto esforço lhes pertence... O conflito, o antagonismo, já não é entre classes, mas de cada pessoa com a sociedade. Não é só uma falta de segurança, também é uma falta de liberdade.
P. Você afirma que a ideia de progresso é um mito. Por que, no passado, as pessoas acreditavam em um futuro melhor e agora não?
R. Estamos em um estado de interregno, entre uma etapa em que tínhamos certezas e outra em que a velha forma de atuar já não funciona. Não sabemos o que vai a substituir isso. As certezas foram abolidas. Não sou capaz de profetizar. Estamos experimentando novas formas de fazer coisas. A Espanha foi um exemplo com aquela famosa iniciativa de maio (o 15-M), em que essa gente tomou as praças, discutindo, tratando de substituir os procedimentos parlamentares por algum tipo de democracia direta. Isso provou ter vida curta. As políticas de austeridade vão continuar, não podiam pará-las, mas podem ser relativamente efetivos em introduzir novas formas de fazer as coisas.
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O sociólogo Zygmunt Bauman. / SAMUEL SÁNCHEZ
P. Você sustenta que o movimento dos indignados “sabe como preparar o terreno, mas não como construir algo sólido”.
R. O povo esqueceu suas diferenças por um tempo, reunido na praça por um propósito comum. Se a razão é negativa, como se indispor com alguém, as possibilidades de êxito são mais altas. De certa forma, foi uma explosão de solidariedade, mas as explosões são muito potentes e muito breves.
P. E você também lamenta que, por sua natureza “arco íris”, o movimento não possa estabelecer uma liderança sólida.
R. Os líderes são tipos duros, que têm ideias e ideologias, o que faria desaparecer a visibilidade e a esperança de unidade. Precisamente porque não tem líderes o movimento pode sobreviver. Mas precisamente porque não tem líderes não podem transformar sua unidade em uma ação prática.
P. Na Espanha, as consequências do 15-M chegaram à política. Novos partidos emergiram com força.
"O 15-M, de certa forma, foi uma explosão de solidariedade, mas as explosões são potentes e breves"
R. A mudança de um partido por outro não vai a resolver o problema. O problema hoje não é que os partidos estejam equivocados, e sim o fato de que não controlam os instrumentos. Os problemas dos espanhóis não estão restritos ao território nacional, são globais. A presunção de que se pode resolver a situação partindo de dentro é errônea.
P. Você analisa a crise do Estado-nação. Qual é a sua opinião sobre as aspirações independentistas da Catalunha?
R. Penso que continuamos com os princípios de Versalhes, quando se estabeleceu o direito de cada nação baseado na autodeterminação. Mas isso, hoje, é uma ficção porque não existem territórios homogêneos. Atualmente, todas as sociedades são uma coleção de diásporas. As pessoas se unem a uma sociedade à qual são leais, e pagam impostos, mas, ao mesmo tempo, não querem abrir mão de suas identidades. A conexão entre o local e a identidade se rompeu. A situação na Catalunha, como na Escócia ou na Lombardia, é uma contradição entre a identidade tribal e a cidadania de um país. Eles são europeus, mas não querem ir a Bruxelas por Madri, mas via Barcelona. A mesma lógica está emergindo em quase todos os países. Mantemos os princípios estabelecidos no final da Primeira Guerra Mundial, mas o mundo mudou muito.
P. As redes sociais mudaram a forma como as pessoas protestam e a exigência de transparência. Você é um cético sobre esse “ativismo de sofá” e ressalta que a Internet também nos entorpece com entretenimento barato. Em vez de um instrumento revolucionário, como alguns pensam, as redes sociais são o novo ópio do povo?
R. A questão da identidade foi transformada de algo preestabelecido em uma tarefa: você tem que criar a sua própria comunidade. Mas não se cria uma comunidade, você tem uma ou não; o que as redes sociais podem gerar é um substituto. A diferença entre a comunidade e a rede é que você pertence à comunidade, mas a rede pertence a você. É possível adicionar e deletar amigos, e controlar as pessoas com quem você se relaciona. Isso faz com que os indivíduos se sintam um pouco melhor, porque a solidão é a grande ameaça nesses tempos individualistas. Mas, nas redes, é tão fácil adicionar e deletar amigos que as habilidades sociais não são necessárias. Elas são desenvolvidas na rua, ou no trabalho, ao encontrar gente com quem se precisa ter uma interação razoável. Aí você tem que enfrentar as dificuldades, se envolver em um diálogo. O papa Francisco, que é um grande homem, ao ser eleito, deu sua primeira entrevista a Eugenio Scalfari, um jornalista italiano que é um ateu autoproclamado. Foi um sinal: o diálogo real não é falar com gente que pensa igual a você. As redes sociais não ensinam a dialogar porque é muito fácil evitar a controvérsia… Muita gente as usa não para unir, não para ampliar seus horizontes, mas ao contrário, para se fechar no que eu chamo de zonas de conforto, onde o único som que escutam é o eco de suas próprias vozes, onde o único que veem são os reflexos de suas próprias caras. As redes são muito úteis, oferecem serviços muito prazerosos, mas são uma armadilha.
Estado de crise. Zygmunt Bauman e Carlo Bordoni. Editora Zahar. 192 págs., 39,90 reais.

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'Combate à corrupção será um dos legados de Dilma' | Brasil 24/7

Outro petista surfando na onda da auto imolação crítica. Auto crítica de que, e para a satisfação de quem? Mas o ministro bem que merece fazer uma. Deixou a lava jato dobrar para a direita até quase torar o tronco...  E agora, como é que tira a curvatura da vara?   

Se ninguém no PT ficou rico com a "roubalheira" que atribuem a ele e Cardozo afirma que alguns petistas "cometeram erros", não podendo, portanto, se responsabilizar o partido por isso. Mas se ninguém no PT ficou rico com a "roubalheira nunca dantes vista no Brasil" (rsrsrs) alguma coisa não bate nessa narrativa.  

Voto distrital misto? Proposta de tucano. 

Refundar o partido que foi fundado há mais de 35 anos? Fundem outro então...Mas talvez não seja bom negócio.

'Combate à corrupção será um dos legados de Dilma' | Brasil 24/7